quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Dia 298 [Contos do ambulatório]

30/09/2009 – quarta-feira

No centro do ambulatório havia uma placa dizendo: “Acompanhantes não devem permanecer neste local”. Todos estavam acompanhados, menos eu e um homem na cama à minha esquerda.

À minha direita havia um senhor de uns 50 anos que estava bastante tranquilo. Quando a enfermeira foi tirar seu sangue para exame, ele apagou. A cena foi sinistra, ele estava deitado, estático, pálido e com os olhos abertos, parecia morto. A esposa via a situação com tranquilidade, mas o médico estava bastante preocupado, gritava pelo nome dele, dava tapinhas no rosto e na mão, mas ele não acordava. Depois de 5 minutos de insistência ele voltou a si e disse que quase sempre desmaiava quando tirava sangue. A esposa sabia.

Na cama da esquerda, um homem de uns 40 e poucos anos, de terno e gravata, se contorcia e gemia de tempos em tempos, com se uma dor muito aguda na região abdominal tomasse conta dele a cada 10 minutos. O som emitido por ele parecia de um gato. Acho que ele estava com dores no rim e tomou uma dose de morfina. A dor passou e ele não parou de responder e-mails através do seu Blackberry. Ele atendeu uma ligação e disse: “Já estou saindo, vim para o 9 de Julho porque era o mais próximo, se precisar pego um helicóptero e vou para o Albert Einstein”. Não sei se era sério, mas ele poderia ter ido para o Sírio Libanês, que é do lado.

À minha frente está uma senhora bastante idosa, com mais de 80 anos, acompanhada por duas filhas. O médico comenta que o caso dela é bastante grave, pois está com a pressão muito baixa, desidratada e com a consciência longe, não está nem conseguindo falar. Eles têm dificuldade para pegar a veia nos braços, portanto partem para a punção próxima ao pescoço. A filha mais nova começa a chorar sem parar. A mais velha está mais curiosa em saber o problema dos outros pacientes, me pergunta o que eu tenho e no fim diz que Deus estará do meu lado. Eu a vi passando em todas as camas.

Na cama ao fundo da sala, à minha esquerda, há uma mulher gorda de uns 30 anos acompanhada do marido, tão magro quanto eu. Ela está com uma dor de cabeça terrível e pressiona a região da testa com as mãos com força, ela chora muito e de vez em quando grita de dor. O marido diz ao médico que ela tem esse tipo e enxaqueca uma vez por mês. Será TPM? O marido não largou a mão dela um só instante.

Sou transferido para a cama à frente da garota com enxaqueca. Uma senhora muito gorda recém chegada necessitará dos aparelhos do local onde eu estava. Ela caiu quebrou o nariz e está com a face roxa. Está retornando ao pronto socorro, pois começou a ter dores no quadril, talvez seja reflexo da queda. A filha dessa senhora precisa gritar para conversar com ela, acho é meio surda. As três enfermeiras têm dificuldade para tirá-la da cadeira de rodas e colocá-la na cama, quase que ela cai novamente.

De repente um alvoroço ao redor daquela velhinha que tem a filha chorosa e em seguida um odor inebriante, a senhora evacuou. Rapidamente os enfermeiros agem para tentar conter a situação. Mesmo eu, que tenho problemas nasais e olfato pouco apurado, começo a passar mal, quase uma náusea, 10 minutos de puro deleite. Nesse momento ouço o marido da garota com enxaqueca dizer que vai tomar um café e outra pessoa, que vai aguardar na sala de espera. Quando me dei conta todos os acompanhantes deixam a sala. Por que será que repentinamente eles abandonaram seus entes queridos, será que somente agora eles leram a placa de advertência?

Trilha sonora: Smells Like Teen Spirit (Nirvana)

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